segunda-feira

O Voo da Gaivota XVI


Natan
Sempre que possível, ia às reuniões no Centro Espírita, para me inteirar dos acontecimentos.Quando não podia, Artur, um dos orientadores do Centro, amigo de muitas encarnações de meu pai, me colocava a par da situação. No Umbral, os chefes sabem de tudo o que lá acontece, com relativa facilidade. Natan, ao voltar ao Túnel Negro naquela noite em que lá estivemos,cientificou-se de tudo.Disseram-lhe que vários espíritos, comandados por um ainda encarnado, entraram em sua fortaleza, levando com eles os que quiseram ir.

Nada danificamos com nossa excursão ao Túnel Negro, só tiramos alguns sofredores de lá. Porém, como Elisa previu, Natan logo soube o nome do encarnado, onde ele morava, seus familiares e o Centro Espírita que freqüentava. Dois de seus servidores, espíritos ligados a ele no trabalho no Túnel, foram observar meu pai e o Centro Espírita.


Na reunião seguinte, foram os dois servidores ao Centro Espírita levar um recado de Natan.Entraram como convidados, sem se despojarem de suas armas e aguardaram o início da reunião em silêncio. Um dos orientadores da casa lhes explicou como deveriam proceder. Como queriam falar pela incorporação, tiveram que aguardar na fila, e só seria permitida a comunicação deles no momento previsto.

Um deles ao observar o ambiente, curioso, conteve-se para não chorar, ao ouvir a explicação do Evangelho e as orações e, quando foi chamado para se incorporar, pediu ao companheiro que o fizesse. O outro desde a entrada do Centro, estava quieto e o tempo todo de cabeça baixa, esforçando-se para demonstrar que era educado, seguindo as ordens recebidas de Natan.

E, perto do médium, para a incorporação, respondeu ao cumprimento de boa-noite, quando lhe foi dirigida a palavra. Depois, assistido e influenciado pela mente de Natan, falou para o que veio, como se fosse o próprio, como se o chefe do Túnel Negro estivesse ali.

- Meu chefe Natan não gostou da invasão que fizeram nos seus domínios. Sofremos violação e exigimos reparação. Sabemos também que essa invasão foi para atender um pedido de sua filha desencarnada, e que ela estava junto. Não sei por que se interessam por imprestáveis, já que foram lá só para resgatá-los.

- Por que chama os toxicômanos de imprestáveis? – meu pai indagou.

- São outra coisa? – respondeu ele rindo – Nem raciocinam mais! Só servem para experiências.

Drogados são fracos e inúteis. Não é à toa que, quando se quer vingar de algum encarnado, incentiva-se-o ao vício e, se ele tiver tendência, perde-se nos tóxicos, tornando-se completamente escravo da droga e presa fácil de seus vingadores. Viciados são fantoches, farrapos humanos. Natan não achou ruim terem levado de lá os imprestáveis.

Irritou-se por terem entrado lá sem permissâo.

- Se eu tivesse pedido permissão, ele consentiria? – indagou meu pai.

- Entrar lá não! Mas lhe daria os imprestáveis – respondeu ele, rindo cinicamente.

- Daria mesmo? - indagou meu pai, que conversava com ele como orientador encarnado da casa.

- Ora - respondeu ele -, não todos ou nem tantos, talvez lhe libertasse alguns. É nosso costume atormentar mais ainda os que são do interesse dos bons.

Fez uma pausa.

O que o desencarnado falou, infelizmente, é o que costuma acontecer, porém, não é regra geral.

Sendo assim, ao notar que alguém preso em seus domínios é do interesse dos socorristas, querem saber o porquê e o torturam. Às vezes, fazem isso presumindo que, desse modo vingam-se dos interessados. Por isso, sempre se faz com cautela a demonstração desse interesse. Logo após a pausa, em que ele observou bem o local, continuou a falar calmamente.

- Deixemos de conversas! Natan exige a devolução de todos e desculpas com pompas.

Quer a reparação! Você com seus comparsas devem ir ao Umbral em horário marcado e, na frente dos convidados dele, se desculparem.

- Volte e diga a Natan que não quisemos afrontá-lo. Mas, por circunstâncias articulares e justas,tivemos que ir lá. Não lhe devolveremos nenhum dos que nos pediram abrigo e infelizmente não faremos o que ele quer.

Todos nós presentes, tanto os encarnados quanto os desencarnados, sabíamos que Natan através de uma ligação com o seu enviado, estava vendo e ouvindo o que ocorria na reunião. Mas, como ele mandou recado recebeu resposta para que o portador a levasse até ele. O desencarnado irritou-se com o que ouviu, porém controlou-se e respondeu:

- Quero deixar claro que ninguém estava lá obrigado. Se existiam alguns presos foi por não cumprirem obrigações. Vocês estão arrumando confusão. Vou embora e darei o recado.

Afastou-se da médium. O desencarnado falava a verdade, pois nos domínios do Túnel Negro ninguém permanecia obrigado. Os viciados iam lá à procura da droga e submetiam-se aos piores vexames e situações humilhantes para conseguir o sustento para seus vícios.

O outro que viera junto e que observava tudo, chegou perto de um dostrabalhadores do Centro e pediu:

- Será que vocês não me abrigariam? Gostei daqui, quero ficar.

- Certamente que sim.

Ao se afastar da médium, o enviado de Natan procurou pelo amigo e o viu na fila dos que iam para a Colônia, como socorridos. Saiu do Centro Espírita e foi cumprir a tarefa que lhe impusera o chefe.

Como previsto, Natan não gostou da resposta e, no dia seguinte, preparou bem seus servidores,armou-os e ordenou que fossem ao Centro Espírita e o invadissem. Deu instrução para expulsarem todos que lá se encontrassem e quebrarem tudo, mas não foi junto, ficou no Túnel Negro.

Artur, prevendo o ataque, organizou a defesa do Posto e do Centro Espírita, para que todos os aguardassem tranquilos. Tentaram realmente invadir, mas, quando se encontravam perto, Artur e os companheiros foram ao encontro deles, dominando-os pela força mental, imobilizando-os.

Levaram-nos, em seguida, para o pátio, já desarmados, e depois os encaminharam para o Posto, acomodando-os numa sala própria. Tudo normalizado, Artur conversou com eles, durante horas. Perguntavam sobre tudo e Artur os esclarecia. Viram a Colônia, pela tela, e lhes foi oferecido socorro médico e abrigo. Após, Artur abriu a porta da sala e disse:

- Podem sair os que quiserem, só que irão sem as armas. Os que desejam ficar conosco serão bem-vindos.

Muitos se mostravam indecisos. Se voltassem, seria como fracassados, não tendo cumprido a tarefa que lhes fora confiada. Temiam o chefe, mas gostavam da vida que levavam, e não queriam mudar. Foram poucos os que gostaram do que lhes foi oferecido por Artur, em nome de todos os trabalhadores do Centro.

Muitos dos desencarnados que vagam pelo Umbral, não têm idéia de outra forma de vida na espiritualidade e, ao conhecer, geralmente aceitam, querem a mudança. Outros, indiferentes, preferem mesmo é continuar como estão.

Do grupo de Natan, alguns ficaram na sala, mas a maioria saiu. Muitos se dirigiram para o Umbral, onde iriam vagar sem rumo, pois não tinham disposição de voltar ao Túnel Negro, de vez que temiam Natan.

Outros, mais corajosos,voltaram, e ficamos sabendo depois que não foram castigados.

Os que permaneceram e aceitaram socorro, foram encaminhados para a Colônia, para a Escola de Regeneração. As armas deles, feitas do mesmo material que constitui nosso perispírito, foram destruídas.

Natan mandou dois de seus servidores, os de sua confiança para ficarem perto de meu pai e eles trouxeram outros dois que foram induzidos a pensar que desencarnados, viciados, que foram induzidos a pensar que meu pai ia lhes dar drogas.

Desencarnados nesse estado têm fluidos pesados e angustiantes. Por isso, Artur levou os dois viciados para o Posto do Centro,onde receberam os primeiros socorros, sendo depois orientados em reunião, da mesma forma que Walter, e obtiveram o mesmo êxito. Artur fez um esquema especial de proteção aos médiuns e freqüentadores do Centro, para que não fossem atingidos pelas vibrações dos seguidores de Natan, como também para as pessoas que sempre estão com meu pai, inclusive os familiares.

Os outros dois, os servidores de Natan, meu genitor convidou-os para ficarem com ele. Seguiram-no de perto, por dias.

Natan, vendo seus dois melhores auxiliares em perigo, chamou-os de volta. O perigo, para ele,era o de se converterem. Meu pai ora, medita, lê e faz com que os desencarnados que estão junto dele, escutem. Trata-os com bondade, porém com firmeza e não aceita suas interferências.

Apesar de cansá-lo muito essa conduta, ele sabe que tem de estar vigilante vinte e quatro horas por dia. E esse tipo de pressão o tem feito crescer, porque o "orar e vigiar" o coloca constantemente em vibração maior, que atinge os desencarnados de forma diferente, levando-os a refletirem e a pensarem em Deus.

Natan veio encontrar-se com meu pai. Esperou-o à noite, perto do Centro Espírita, e disse a um dos guardas que queria falar-lhe. Meu pai foi ao seu encontro.

- Você é um feiticeiro terrível! - disse Natan. - Não quero que nenhum dos meus companheiros sofra sua influência. Exijo uma reparação sua e tudo ficará por isto mesmo, mas que vá ao Túnel Negro e me peça desculpas. Abro mão do resto.

A palavra "feiticeiro" foi empregada por ele, para definir aquele que tem força mental e que a usa tanto para o bem como para o mal. E o tom de desprezo seria para ofender. Desencarnados que, temporariamente estão seguindo o mal, gostam de chamar meu pai assim, como também de indiano, porque ele, em muitas encarnações, teve a Índia como berço.

- Você tem me observado - respondeu meu pai -, deve saber que sempre que erro, peço perdão de coração. Nunca peço por orgulho, pois levo muito a sério o ato de me desculpar.

Quando o faço, é porque entendi que errei e procuro não mais incidir nessa falta, para não ter que me desculpar pela segunda vez pelo mesmo ato. Isto porque, reconhecendo meu erro, me esforço para melhorar. Não me arrependi por ter ido ao Túnel Negro e libertado não só o desencarnado, que foi o motivo de socorro, mas todos os que quiseram nosso auxílio. Faria de novo, por isso, em respeito a você, não posso me desculpar.

(15) - Anteriormente, o Sr. José Carlos havia convidado dois espíritos para ficarem ao seu lado e agora convidou Natan. Para fazer isto, é necessário ter muitos conhecimentos e moral elevada.

Alerto os encarnados, para não agirem assim, sem o preparo devido. (N.A.E.)
Para nos reconciliarmos com alguém, mesmo não sendo culpado, não nos custa pedir desculpas.

Meu pai com sua atitude estava querendo ajudar Natan. Tentava fazer que esse espírito se voltasse para Deus.

- Atormentarei você! - exclamou ele.

- É um direito seu - respondeu meu pai. - Convido-o a ficar comigo.(15) Só que eu também tenho direitos. Você tentará me atormentar, atingir-me, eu me esforçarei para não receber sua influência negativa, como também tentarei transmitir-lhe as minhas sugestões.

Terá que me escutar! Será só entre nós dois. O mais forte irá influenciar o outro. E o mais forte será aquele que tiver a vida, os pensamentos e as atitudes baseados na verdade. E a verdade nunca será produto de nosso desejo, esperança ou ambição, mas, sim, sempre a mesma, infinitamente, no tempo e no espaço.

- Não sou de fugir de desafio. Vou agora ao Túnel Negro tomar algumas providências e voltarei.

Aguarde-me!

- Não o estou desafiando. Será um prazer conviver com você! Vamos aprender muito um com o outro.

Natan afastou-se, já havia perdido muitos dos seus seguidores e achou que só ele estaria apto a dar uma lição merecida naquele que, em sua opinião, o desafiara. Estava com raiva de todos do grupo, e com os desencarnados, sabia por antecipação que não podia com eles. Com meu pai era, porém, diferente, ele estava na came, sujeito a muitos condicionamentos e me lindres devido às necessidades e funções do corpo, sendo assim mais fácil de atingir e prejudicar.

Entendia que,atingindo um encarnado, atingiria todo o grupo. Organizou, então, o Túnel Negro para que continuasse a funcionar sem ele e, assim, no outro dia, foi ao encontro de meu pai e começou a acompanhá-lo de perto. Meu genitor continuou com sua vida normal, de trabalhador no plano físico e espiritual.

Natan não ficou, de imediato, como obsessor de meu pai, mas sim curioso, e com raiva daquele momento, quis conhecer como era o dia-a-dia de uma pessoa tão diferente das com que convivera.

Natan pressionava meu pai. Forçava-o a pensar em coisas mundanas, para que baixasse a vibração. Meu pai, por outro lado, meditava em coisas superiores e Natan era forçado naturalmente a sentir as mesmas coisas. Percebia as sugestões e desejos terrenos. Porém, mostrava mentalmente a Natan a estupidez e a mediocridade daqueles que usam as necessidades e funções do mundo físico, como propósito de vida.

À noite, meu pai desligado do corpo físico se dirigia para o trabalho espiritual e Natan ia junto. .Encaminhava-se ao Posto do Centro para cuidar dos doentes,conversava com os socorridos, e ele ao seu lado. E foi assim, por muito tempo, até que Natan começou a se interessar pelo trabalho realizado no Posto, e começou a falar de si, e meu pai atenciosamente o escutou.

Natan foi médico, quando encarnado. Ambicionando enriquecer, usou a medicina somente como profissão para ganhar dinheiro. É preciso lembrar que o trabalhador faz jus ao seu salário, mas nenhum profissional deve só visar o lucro, mas sim fazer também, através de seu trabalho, todo o bem possível. Médicos lidam com dores e por isso devem, também, ser humanitários.

Trabalharem pelo sustento material, sim, mas sem se esquecerem de fazer aos outros o que queiram que lhes façam. Natan fez muitos abortos e receitou remédios proibidos,desde que lhe pagassem. Mas a desencarnação chegou e se viu diante de muitos inimigos que queriam vingança. A situação o apavorou demais, primeiro porque era ateu,segundo, porque aquele bando o atormentava sem poder destruí-lo. Vingavam-se por tê-los impedido de reencarnar, ou por não terem sido atendidos, porque não podiam remunerá-lo.

Estava irado quando o tiraram de seus perseguidores. Eram espíritos, moradores de uma cidade umbralina, que vieram e o levaram. O chefe dessa cidade sabia quem ele era, mas deixou que sofresse por uns tempos, para que ficasse lhe devendo obrigação. Natan não é o nome verdadeiro dele, tendo escolhido esse cognome tempos depois, talvez para impor mais respeito a seus inferiores. Levado à cidade umbralina, o chefe conversou com ele e lhe ofereceu abrigo em troca de seu trabalho como médico.

Natan não era ocioso, sempre foi trabalhador, por isso aceitou e se aliviou por ficar livre do bando que o perseguia,mas com o qual aprendera tantas maldades. O chefe daquele local, no intuito de organizar um lugar especializado em tóxicos, fundou o Túnel Negro e o colocou para administrá-lo. Com o passar dos anos,  chefe se desinteressou pelo lugar e Natan ficou sendo o senhor absoluto.

O Túnel Negro não forçava ninguém a ficar lá e nem seus moradores saíam à procura de desencarnados para irem lá. Os viciados desencarnados é que o procuravam, em busca das drogas. Só que, depois de serem abrigados, tinham que seguir as normas da casa e trabalhar para eles. Existem muitos lugares, abrigos, cidades no Umbral, para onde os desencarnados viciados são levados como prisioneiros.

Como também há outros lugares, como o Túnel Negro, onde os desencarnados não são obrigados a ir e nem a permanecer. É lugar de livre acesso. Mas Natan era insatisfeito e isso lhe doía e o atormentava. Instalou-se, então, a troca de fluidos entre eles. Meu pai começou a sofrer os de Natan, sentindo doer-lhe por dentro, como um vazio profundo. Certo dia, meu pai estava meditando e Natan perto dele, quando meu genitor lhe disse:

"Natan, é falta de Deus! É a ausência do Pai em você que lhe dói tanto. Você era ateu, mas não pode dizer agora que ainda o é. Por que, então, não se aproxima do Pai?"

Natan não respondeu e se afastou. Depois de meses, era a primeira vez que se afastava.Recolheu-se num canto no Umbral e pôs-se a pensar. No dia da reunião, quase no horário de começar, ele entrou no Centro, pediu licença e se colocou na fila dos que iam receber orientação, pela incorporação. Estava diferente, sem seus colares e suas armas.

Na sua vez de se comunicar, aproximou-se educadamente de uma médium, cumprimentou meu pai e disse:

- Você me venceu!

- Não! Natan, você não lutou comigo.Mas lutou consigo mesmo. Era a ausência de Deus que o atormentava. Você é infeliz e apenas o convidamos a aprender a ser feliz. Fico contente por você querer mudar. Gosto de você! Venha viver uma vida digna de um espírito.

- Quero ser seu amigo! - exclamou Natan emocionado.

- Sejamos então amigos! Preciso muito de amigos.

Natan foi levado para a Escola de Regeneração. Após ter feito o curso, foi trabalhar num Posto de Socorro do Umbral onde exerce seus conhecimentos de Medicina, em socorro aos necessitados. Sempre que pode vai visitar meu pai e assistir às reuniões do Centro. Trabalha muito. Artur, sempre que o vê, costuma dizer de forma carinhosa:

"Ama muito, porque foi muito perdoado!

Artur falou, modificando o texto do Evangelho de LucasVII:47. "São lhe perdoados muitos pecados, porque muito amou."


continua...
 
bjs,soninha 


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