segunda-feira

A Casa do Escritor XIII


IX

TRABALHANDO COM A EQUIPE


A Casa amanheceu em festa. Muito mais flores e convidados deram-lhe um brilho todo especial. Um dos moradores ia reencarnar. Isto mesmo! Fausto, um ativo trabalhador da Casa, ia vestir um corpo carnal. Estava no pátio recebendo abraços, incentivos e votos de êxito. Participei da festa, embora o conhecendo há pouco tempo. Ele é simpático, inteligente e muito sorridente. Estava contente com a demonstração de
carinho, embora às vezes leve preocupação brilhasse em seus olhos.

Ficou o dia todo rodeado de amigos, passei a fazer parte da roda, escutávamo-lo com prazer.

- Meus futuros pais são filiados da Casa. Donos de uma pequena Editora

Espírita, lutam para mantê-la e ampliá-la. Terei uma irmã e um irmão, ambos lindos e amigos. Vou reencarnar esperançoso!

- Conseguirá vencer amigo! - disse-lhe um dos companheiros.

- Conseguirá fazer o que planeja!

- Preparei-me muito. Fiz cursos, trabalhei aproveitando todo o meu tempo.

Sinto deixar a Casa, amo-a tanto. Mas será por tempo determinado. A ela voltarei, se Deus quiser. Vou confiando na ajuda de tantos amigos. Continuo filiado a Casa. Espero fazer tudo que planejei e contribuir encarnado em prol da boa Literatura.

Antônio Carlos estava conosco, afastei-me com ele alguns passos do grupo, para perguntar:

- Ele continuará filiado à Casa?

- Sim.

- Se ele vier a falhar na carne, o que acontecerá? Ele preparou-se para se dedicar à Literatura Espírita, se as dificuldades o levarem a outras atividades, continuará filiado?

- Criança e adolescente receberá nossa atenção como filiado que é. Na fase adulta, os cuidados serão redobrados. Terá apoio e incentivos para fazer o que lhe cabe por escolha. Mas ele tem seu livre-arbítrio, poderá se envolver em outras atividades, e não fazer o que se propôs. Depois de muitas tentativas de nossa parte para chamá-lo à realidade e ele recusar, a Casa retirará sua ajuda. Mas ficará sempre como amigo.

Porque ele os fez. Quanto à filiação, no caso dele, que muito trabalhou pela Casa, ficará cancelada, mas podendo voltar quando quiser.

- Isto já ocorreu? Alguma filiação foi cancelada?

- Infelizmente sim.

- Acho que é porque nem todos se preparam para reencarnar, não é?

- Sim. Infelizmente não acontece com mais freqüência do que deveria ser. A preparação se dá com uma pequena parte. Vemos milhares de reencarnações ocorrerem todos os dias e uma pequena fração somente recebe preparo. Lembro-lhe que o livrearbítrio é respeitado. O desencarnado também tem a sua vontade. A reencarnação é oportunidade para todos. Quem gosta de aprender, o faz encarnado ou desencarnado.

Este preparo inclui estudos, dedicação e nem todos estão dispostos a isto. Patrícia, mesmo espíritos com dom literário não aceitam o ensino da Casa. Tanto que vemos muitos escritores com talento escrevendo tantas barbaridades.

- Antônio Carlos, outro dia conversei com um visitante desencarnado que está em outra Colônia estudando e trabalhando. Veio aqui conhecer e inscrever-se em cursos da Casa. Disse-me que cometeu muitos erros no campo literário. Que se via num terreno só de plantações ruins. Plantou muitas coisas más. A colheita o incomodou. Pensou: se me dedicar só à colheita, não terei tempo para mais nada. Mas os ensinos que recebeu no Plano Espiritual o incentivaram. Não precisaria necessariamente colher da plantação ruim, pelo trabalho no Bem, ele poderia limpar seu terreno e plantar boa semente. E evitar a colheita ruim. Que acha disto?

- Que pensa que sua tia Vera e eu fazemos? Pelo trabalho estamos "roçando" a plantação ruim. Mas, pelo trabalho, realmente. E, mesmo assim, ferimo-nos tantas vezes com os espinhos. Se fizermos o trabalho todo, evitaremos a má colheita. Nos pedaços limpos, já plantamos a boa semente que germina. A boa planta nasce com amor e nos sustentará na luta com sua colheita bendita.

- Patrícia, se todos trocassem a colheita ruim pelo trabalho no Bem, pela transformação interior para melhor, a colheita de dores e sofrimentos sumiria da Terra.

Voltamos nossa atenção ao Fausto que recebeu amigos o dia todo numa demonstração de confraternização e carinho. À noite, ele partiu, ia para o Departamento de Reencarnação, numa Colônia de Socorro. Partiu feliz e confiante. Desejei ardentemente que tivesse êxito nos seus propósitos.Durante o tempo que estive na Casa do escritor vi algumas reencarnações. Todos com muitos incentivos e esperando realmente que cumprissem o que planejaram. A equipe fora chamada para assistir a uma desencarnação de um dos seus filiados. Fui, feliz.

Nosso amigo prestes a desencarnar estava doente, hospitalizado.

Já há alguns dias um companheiro da Casa o acompanhava, também estava com ele o companheiro desencarnado de muitos anos de trabalho. Chegamos ao local e fomos cumprimentados pelos amigos desencarnados. Agora éramos cinco. Nosso companheiro que há dias estava com ele nos informou:

- Nosso amigo piora. Sente a desencarnação e está tranqüilo.

Nestes dias eu o intuí para que deixasse seus assuntos em ordem.

Atendeu-me, organizou papéis, tudo que um encarnado tem que deixar certo para facilitar a vida dos familiares.

- Tem dores? - indaguei.

- Sim, tem tido. Mas não reclama.

- Ele não poderia ficar mais tempo? - indaguei novamente.

- Faz um trabalho tão bonito e não está velho.

- Ele mesmo, antes de reencarnar, marcou o tempo de sua desencarnação. Está indo na data certa. De fato, fez um trabalho lindo, isto justifica nossa presença ao seu lado.

Não tardou a ter outra crise. Familiares encarnados e o médico atenderam-no solícitos. Nosso trabalho de desligamento começou tão logo seu coração parou. Ele adormeceu, nada sentiu ou viu. Horas depois, levamo-lo para a uma Colônia de Socorro e deixamo-lo bem instalado num quarto. Ali, a equipe da Colônia, do Hospital, cuidaria dele. Seu companheiro iria ficar com ele e acompanhá-lo nos primeiros passos como
desencarnado.

- Quando estiver bem irá para a Casa do escritor? - indaguei.

- Dependerá de sua vontade, mas este amigo é amante da Literatura, creio que continuará a trabalhar com ela.

- Que bonita a desencarnação de pessoas vitoriosas em suas tarefas! De pessoas boas! - exclamei.

Mas tivemos uma desencarnação de um filiado que não queria a desencarnação.

Estava revoltado com os familiares e com os assuntos financeiros. Cumpriu pela metade o que se propusera. Sua desencarnação foi mais dolorosa, porque se esforçou para não desligar. Mas o corpo morre, o espírito tem que abandoná-lo. Adormecemo-lo com passes, desligamos e foi levado para um Posto de Socorro. 

Cabia a ele aceitar ou não o socorro oferecido.

- Se ele não aceitar? - indaguei a um dos meus companheiros de equipe.

- Poderá voltar para o lado da família ou vagar. Mas como fez muitos amigos, tanto encarnados como desencarnados, não ficará desprotegido. Os amigos encarnados pedirão por ele e os desencarnados irão até ele oferecer ajuda. Ele é uma boa pessoa, inteligente, saberá definir o que lhe é bom.

Curiosa, indaguei ao meu companheiro.

- Flávio, muitos dos filiados são ativos em outras áreas também. Muitos, além de se dedicarem com carinho ao livro Espírita, são médiuns trabalhadores em Centros Espíritas. Outros trabalham em áreas sociais. Quando desencarnarem, quem virá ajudálos?

" N.A.E. - Guia, protetor, o desencarnado que trabalhou com ele no trabalho do bem.

- Como é bom fazer e ter amigos. E ter quem nos ajude neste momento importante que é a desencarnação. Isto ocorre realmente.

Há filiados que trabalham ativos em outras áreas. Bem, quanto a quem irá ajudá-los na desencarnação dependerá dele e do seu companheiro desencarnado. O importante é ter perto bons amigos na hora do desligamento. Depois ele escolherá a atividade que irá cultivar.

Fomos chamados para auxiliar na desencarnação de uma filiada diferente. Não era Espírita. Por muitos anos dedicou-se à boa Literatura, a infantil, e com muito carinho. Sempre se esforçou para passar nos seus livros a boa moral. Como teve uma religião que não explica o que seja a morte do corpo, temia a desencarnação e isto dificultou nosso trabalho. Por dias acalmamo-la com passes.

Desencarnou tranqüila e foi levada para uma Colônia. Certamente iria estranhar, mas como era inteligente e boa acreditávamos que logo estaria bem. Quanto à sua ida à Casa do escritor, se quisesse ir, iria demorar, antes necessitaria aprender muito e adaptar-se à nova vida.

A equipe da Casa estava sempre alerta aos pedidos de ajuda de quem lida com livros Espíritas. Com carinho especial auxiliam Feiras, Bancas e as Editoras. Ia acontecer uma Feira do Livro Espírita importante. Era a primeira que o grupo realizava. Fomos convidados a participar para incentivar e para protegê-los, porque a equipe do Umbral da região estava furiosa com o evento e prometia tumultuar o local.

Mas tudo deu certo. Durante a feira, uma equipe da Casa ficou o tempo todo nas barracas e foi um sucesso. Os irmãos do Umbral bem que observaram de longe. Foram convidados a aproximar-se para ver melhor. Uns vieram, a maioria foi embora ou ficou olhando de longe. Os que vieram, olharam os livros e conversaram, muitos pediram socorro. No final, os organizadores da feira ficaram felizes e nós também. A Feira do Livro Espírita é sempre uma distribuição de bens, de ajudas e de instruções, que leva muitos a procurar caminhar rumo ao progresso.

Ia também muito ao Centro Espírita que minha família freqüenta. Que grande aprendizado é para o desencarnado trabalhar num Centro Espírita. Com os problemas diários surgidos, a ajuda é constante tanto a encarnados como a desencarnados necessitados.

Artur, companheiro desencarnado de trabalho de meu pai, é meu grande amigo.

Está sempre sorrindo, é muito instruído e inteligente. Gosto de vê-lo em atividades no Centro. É para mim um exemplo a ser seguido. É querido por todos. Há tempo observava-o e pensava: "Será que Artur tem uma história interessante? Que acontecimentos o teriam levado a ser tão dedicado?"

Numa tarde em que o Centro estava com pouco trabalho, e isto acontece raramente, os trabalhadores conversavam no pátio.

Entrei no salão onde se realizavam os encontros de encarnados e desencarnados. Entrei devagarinho e vi Artur diante de um quadro que retrata o Mestre Jesus. Estava distraído, encantado, seu rosto sereno irradiava harmonia e amor.

- Oi, Artur, atrapalho?

- Não, menina Patrícia. Deseja algo? Respondeu sorrindo e olhando para mim.

- Lindo quadro! Ama muito Jesus, não é?

- Sim.

- Teria ocorrido com você um fato especial pára amá-lo assim?

- Só por ter nos deixado estes ensinamentos maravilhosos seria o bastante para que todos nós o amássemos. Mas você tem razão, existe algo particular entre Jesus e mim.

- Posso saber que fato é este? - disse.

Sentei numa cadeira. convidando-o com a mão a sentar-se ao meu lado. Ele o fez.

- Você está me saindo uma caçadora de histórias...

Rimos.

- Há muito tempo, Patrícia, fui um espírito rebelde, zombava de tudo e de todos, só pensava em prazeres e em mim da forma mais egoísta possível. Era terrível, encarnado, e horroroso, quando desencarnado. Desencarnado, uma vez me uni a um grupo de amigos afins, formamos uma legião para obsediar uma pessoa. 

Tudo estava bem para nós, judiávamos do pobre encarnado numa farra. Devo dizer que, para ser obsediado, o encarnado vibrava igual e tudo que sofria tinha como conseqüência uma má colheita. Tudo corria bem para nós, quando nos vimos numa enrascada. Senti-me preso, sem poder me mover, como todos os outros companheiros. Só ouvíamos e víamos o que acontecia. Uma força maior, muito grande, nos prendera. 

Vimo-nos cercados por várias pessoas, umas encarnadas e outras desencarnadas. Mas esta força que nos prendia nos fazia tremer, e ao mesmo tempo nos maravilhava, vinha de um encarnado. Este homem fenomenal colocou a mão sobre a pessoa que obsediávamos e disse: "Tua fé o salvou!" Olhei para este encarnado, vi uma imagem humana de rara beleza e tranqüilidade. Nunca vira pessoa assim. "É Jesus!" - disse um dos encarnados que o acompanhava. 

"É Ele, Jesus Nazareno, que curou este homem!" Jesus me olhou com profundo amor, não me condenou, me amou. Seu olhar meigo e bondoso me olhando é um fato não esquecido. Fomos retirados de perto daquele obsediado por uma equipe desencarnada e levados para um Posto de Socorro. Lá fomos orientados para o Bem. Mas éramos livres para ficar ou não.

Se voltássemos, estávamos proibidos de nos aproximar do ex-obsediado. A maioria ficou, eu fiquei e fiz um voto de me modificar.Nunca esqueci que por momentos vi Jesus. Este encontro ficou forte em mim. Depois de um preparo, reencarnei. Não foi fácil minha luta. Tinha muitos vícios e maus costumes como uma colheita bem amarga. Encarnei muitas, muitas vezes nestes quase dois mil anos. Sempre procurando melhorar. 

A imagem do meu encontro com Jesus vinha de modo vago, quando estava encarnado. Sempre, na carne, gostei de olhar imagens, quadros do Mestre Nazareno, tinha sempre uma saudade sem entender o porquê. Quando desencarnado, lembrava do ocorrido, este fato sempre me deu forças para melhorar e progredir. Nosso encontro me marcou muito, tanto que memorizo e a cena com todos os detalhes me vem à memória. Posso ainda sentir seu olhar de amor.

Nestas minhas romagens pela Terra, fui sacerdote católico, pastor protestante, sempre tentando seguir Jesus. Tantas vezes me enganei. Mas, nas últimas encarnações, melhorei realmente e foi na última que encontrei a Doutrina Espírita e entendi melhor os ensinamentos do Mestre Jesus. Tento só, Patrícia, seguir seu exemplo. Amo meu trabalho junto aos nossos irmãos que estão nas trevas da ignorância, que temporariamente estão entrelaçados no erro, com o mesmo Amor com que Jesus me olhou por segundos.

Abracei-o. Não conseguimos falar mais nada. Entendi.

Todos nós temos nossa história e, quem sabe,um fato particular que nos leva ao Amor.



Patrícia / Espírito
Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho / médium.
bjs,soninha

Nenhum comentário: