Do romance de Paulo e Ofélia, nasceu Caio registrado só no nome de Ofélia. Paulo então alugou uma casa razoável para Ofélia e o menino, e passou a sustentá-los. Anos viveram assim, o sogro de Paulo adoeceu gravemente, temendo deixar a fortuna nas mãos do genro e que este desse parte do seu dinheiro à amante e ao filho bastardo, chamou o genro e disse-lhe:
“Paulo, sua aventura faz infeliz minha amada filha, gosto de você, fez prosperar minha fortuna nestes anos, é trabalhador e honesto. Não ficarei vivo muito tempo e vou deixar tudo o que tenho para meus dois netos, Sérgio e Carla. Temo que deixando para Rosa, você, casado com ela em comunhão de bens, venha a dar o que é meu para sua amante que odeio e seu bastardo filho.
Fiz meu testamento e tenho que nomear um tutor, poderá ser você, mas com a condição que você também passe o que é seu para Sérgio e Carla, se não o fizer nomearei tutor dos meus netos, José, meu empregado, e desde já passará ele a cuidar de tudo, inclusive da direção do armazém.”
“O senhor não pode fazer isso?!”, espantou Paulo.
“Posso e farei”, continuou o sogro. “Se fizer já o que quero, continuará a cuidar de tudo como sempre.Por que hesita, Paulo? Sérgio e Carla devem herdar tudo.Rosa já concordou. Dou-lhe três dias para responder-me.” ·.
Paulo revoltou-se, ficou nervoso, amava o que fazia e se orgulhava em ser o chefe. Entretanto, conhecia o sogro, sabia que não voltaria atrás; ou fazia o que ele queria, ou José assumiria tudo. O sogro de Paulo nesta existência foi Sr. Caio seu pai, que odiava a amante do genro, não gostava da esposa do filho, demorou para ter-lhe amizade.
Paulo fez o que o sogro queria, escondeu este fato da amante, entretanto tornou-se inquieto e nervoso. Rosa,sabendo causa, ignorou-o. Sr. Caio fez tudo bem feito, elaborado por um bom advogado, foi tudo registrado em Cartório. Assim, Paulo tornou-se pobre, era só tutor dos filhos. Logo após, o pai de Rosa faleceu e a notícia do testamento espalhou-se pela cidade.
Ofélia não gostou, pensava e queria que Caio herdasse, também, era filho de Paulo e tinha direitos. Sonhava com o filho rico para que ele pudesse estudar. Caio desde pequeno queria ser médico, brincava e só falava nisso. E, para Ofélia, ele tinha jeito de médico e sonhava em formá-lo.
Caio era bom menino, não entendia o que ocorria com os pais, nas visitas paternas, a mãe fazia-o tomar-lhe a bênção e sair em seguida. Temia o pai e sentia vergonha em sua frente. Tentou saber do porquê de ele não morar com eles, indagou da mãe, esta ficara nervosa e lhe batera, preferiu então não indagar mais. Estava proibido de ir para os lados da casa do pai e de conversar com os outros irmãos.
Isso o entristecia, sempre quis ter irmãos e não podia nem conversar com eles nem cumprimentar o pai fora de sua casa. Conhecia seus irmãos, via-os de longe com a mãe deles, achava-os bonitos, foi só na adolescência que entendeu tudo.
Inconformada com o procedimento de Paulo, Ofélia exigiu do amante que doasse alguma propriedade a Caio, com a negativa deste, começaram as brigas entre os dois.
Paulo começou a se cansar de Ofélia, de seus queixumes, começou a se esquivar, rareando as visitas e dedicando-se mais aos filhos e a doce esposa.
Ofélia não se conformou. Paulo ainda os sustentava, masela sentia que o perdera. Havia ela feito muitos abortos, tivera Caio na esperança de prender o amante e agora queria, através do filho, garantir seu futuro.Na tentativa de tê-lo como antes, mandou-lhe um bilhete marcando um encontro. Paulo compareceu, mas estava frio e indiferente Ofélia tornou-se agressiva e brigaram violentamente. Paulo aos gritos disse que estava tudo terminado e se ela o importunasse novamente não daria mais dinheiro nem para o filho nem para ela.
“É seu filho e tem que sustentá-lo”, disse indignada Ofélia.
“Ora, nem sei se o garoto é meu, faço muito em sustentá-lo, não vou deixar nada a ele, nunca vou querer bastardos.
Filhos são só os da minha esposa que é honesta. Bastardo não merece nada nem a amante.”
Paulo saiu e Ofélia, em lágrimas, jurou vingar-se.
Esperou uns dias para ver se o amante mudava de idéia, mandou-lhe vários bilhetes, que foram devolvidos. Paulo também negou-lhe dinheiro. Ofélia, com ódio planejou sua vingança. Ela sabia de todos os costumes da casa do amante e um destes pareceu-lhe importante: eles iam à missa todos
os domingos pela manhã.
Paulo morava com a esposa e os filhos na casa que pertencera ao sogro, uma propriedade grande e bonita, uma pequena chácara, não muito afastada da cidade, que na verdade, era separada desta por um morro.
Assim, para irem à cidade tinham de subir o morro por uma estrada bem cuidada e bonita, talhada na encosta, de um lado barranco, do outro encosta pedregosa, buracos perigosos.
Ofélia conhecia bem o local, muitas vezes fora espionar a casa, Rosa e os filhos, corroída de ciúme e inveja deles.
No domingo cedo foi para lá e escondeu-se perto da cocheira. Viu o preto velho que cuidava dos cavalos providenciar a charrete que os levaria à igreja. Ao vê-lo afastar-se, talvez para avisar que a charrete estava pronta, Ofélia correu até a cachoeira, pegando uma faca que trazia escondida na cintura e rapidamente examinou a correia que ligava a charrete aos cavalos. Viu que estava seca e gasta, sorriu achando-se com sorte.
Cortou parte da correia, deixando-a presa só por um pedaço, fugiu apressada, voltando à sua casa cautelosamente, evitando ser vista.
Naquele domingo, Sérgio acordara febril e Rosa achou melhor que o filho ficasse acamado e não quis ir à igreja, preferindo fazer-lhe companhia. Foram à missa, Paulo e Carla a caçula, que estava com oito anos, era uma criança linda e inteligente.
Paulo gostava de andar com os cavalos a galope, todos sabiam disso. Rosa sempre temia suas disparadas e ele, quando estava com ela, ia mais devagar. Naquela manhã, só com a filha, chicoteou os cavalos, dois garbosos corcéis, que dispararam e puseram-se a subir o morro. A filha ria, entusiasmada fechando os olhos, sentindo o vento forte que desarrumava seus cabelos longos.
A correia acabou se rompendo,desligando a charrete dos cavalos que continuaram disparados e assustados. A charrete voltou alguns metros, Paulo pensou em pular, porém seu primeiro instinto foi salvar a filha, mas, não teve tempo, rolaram pela ribanceira.
Paulo acordou horas depois já no seu leito, foi socorrido por trabalhadores que também iam à cidade. Reconheceu o médico ao seu lado. Sentiu fortes dores pelo corpo todo, recordou o acidente e sentiu-se aliviado por estar vivo.
— Carla, Carla, onde está você filhinha?!
Lembrou-se aflito da filha, o médico bondosamente contou-lhe que a menina batera a cabeça numa pedra e falecera.
Paulo chorou muito, sentiu-se culpado, Rosa também sofreu muito, mas consolou o esposo. Passados uns dias, Paulo percebeu que não movia as pernas e a triste notícia o deixou desalentado, fraturara a coluna e não mais andaria.
Pensaram que o acidente poderia ter sido proposital, mas não tiveram como provar já que a correia estava velha.
Todos sabiam que Paulo corria e ninguém vira estranhos por ali, foi dado como acidente. Tanto Paulo como Rosa não descartaram que poderia ter sido tramado por Ofélia.
O casal passou a viver isolado e triste, Paulo tratava dos negócios em casa e Rosa passou a ir ao armazém e logo Sérgio passou a ajudá-los e a cuidar de tudo. Com a morte da irmã, passou a ser o único herdeiro.
Sérgio viveu muito tempo encarnado, foi honesto, simples, bom administrador e empregador. Agora voltou com missão maior, administrar uma fortuna imensa para o bem comum de muitas pessoas, que, através de sua fortuna, terão salários dignos de seus sustentos.
Paulo viveu oito anos no leito e desencarnou, amargurado. Rosa cuidou dele bondosamente, mas também tornou-se triste e quieta, só se alegrando com o filho.
Com a desconfiança de que poderia ter sido Ofélia a causadora do acidente, Paulo não quis mais saber da examante e nunca mais os ajudou, não viu mais o filho e não se preocupou com ele.
Para sobreviver, Ofélia voltou ao trabalho de doméstica, tornou-se revoltada, descontava suas mágoas no filho. Caio era boa criança, obediente, trabalhador e ajudava a mãe em tudo que podia.
Ofélia dizia sempre ao filho:
“Como me arrependo de não ter abortado você também.
Se não fosse você, não teria que trabalhar tanto assim.”
Era o que realmente sentia em relação ao filho, não ligou para o infortúnio do ex-amante, mas a morte da menina a abalara, começou a sentir remorsos e a sonhar sempre com ela. Tinha horror a estes sonhos, se acordava durante a noite, fazia o filho ficar acordado ao seu lado. Já com dez anos, Caio foi trabalhar numa farmácia começou a ajudar nas despesas de casa, logo após a mãe parou de trabalhar e Caio passou a sustentá-la.
Viveram miseravelmente e quando Caio completou dezoito anos Ofélia desencarnou.
Paulo e Ofélia encontraram-se no Plano Espiritual, sofreram com rancores. Rosa, mais resignada, e Carla os ajudaram a reconciliar, arrependeram-se, reconheceram seus erros, pediram para reencarnar. Ofélia e Rosa seriam irmãs carnais para aprender a se amar, prometeram que iriam se respeitar e viver em paz. Ofélia, porém, culpava-se muito por ter provocado o desencarne de Carla e a invalidez de Paulo.
Planejou ficar inválida para um resgate, para ser livre do remorso que tanto a fazia sofrer, escolheu passar pela mesma dor. E foi para proteger Carla, evitando que fosse atropelada, que veio nesta vida a tornar-se inválida.
Como vê Antônia, reencontraram-se e Caio veio até eles como bastardo Sérgio e Carla tiveram como mãe a examante do pai que odiaram e, graças a Deus, aprenderam a amar.
— É por isso - disse Antônia -, que Carla e Sérgio gostam tanto de Rosa e, a cada dia que passa, ligam-se mais a ela.
— Sim, reencontraram a antiga mãe. Ofélia a traiu no passado, nesta duvidou da irmã e sofreu a dúvida por anos, pensou que a irmã a traíra.
— Rosa é honesta e boa, nunca pensou em trair ninguém.
— Ofélia foi traída, Paulo teve outras amantes.
— Sim, fui uma delas. Diga-me, Antônio Carlos, o que aconteceu a Caio?
— Caio gostava de seu trabalho, tornou-se boticário na farmácia em que trabalhava. Após a morte de sua mãe, sua vida melhorou e passou a cuidar melhor de si mesmo e dedicou-se ao trabalho. Caio há muito vem ligado à Medicina, porém, nunca exerceu como deveria um bom cristão, com humildade e bondade.
Orgulhoso por ser médico, julgava-se melhor que os outros. Nessa existência anterior, como lição a seu Espírito, teve vontade de estudar e não pôde, aprendeu a dar valor aos estudos. Mas quem sabe recorda. Caio entendia de doenças e remédios e tornou-se um boticário, um farmacêutico respeitável, muito procurado que atendia a todos com carinho.
— Quase que Caio nesta existência não cursa Medicina, fazia outro curso - comentou Antônia.
— Antônia, quem quer ser útil e crescer em qualquer profissão encontra oportunidades. Caio, embora tenha estudado Medicina no espaço antes de reencarnar, não assumiu compromisso para exercê-la novamente encarnado.
Muitos fatores, acontecimentos, influem no estágio do corpo, podendo mudar muito o planos. Aprendemos muito em cada função, cada profissão exercida. Espírito livre tem gostos e preferências. Caio que nunca deixou de amar a Medicina, com a mudança que houve em sua vida, com a descoberta de sua adoção, ficou desejoso em exercê-la com maturidade e bondade.
— E você, meu amigo, planeja ser médico novamente, quando encarnar? - perguntou Antônia sorrindo com sua indiscrição.
— Tenho ainda muito tempo de trabalho desencarnado, quando encarnar não sei o que poderá falar mais alto, meu amor pela Música, pela Literatura ou pela Medicina. Espero somente servir a Deus em qualquer função, minha indiscreta amiga.
— E Cidinha, Antônio Carlos? Minha filha ficou órfã, também foi adotada.
— Cidinha é ligada aos pais adotivos que por abusar da paternidade não puderam gerar seus próprios filhos. Veio e é ente querido por vias ilegítimas, mas legítima pelo amor.
— Não estou ligada ao grupo? Caio e Cidinha são estranhos para mim?
— Estranho ninguém é um do outro, somos irmãos e a Humanidade toda é nossa família. Por afinidades, carinho formamos grupos e os mais esclarecidos ajudam os retardatários.
— Devo ser uma das retardatárias, destas pessoas que só pensam naqueles que a amam para receber benefícios - disse Antônia, melancólica.
— Antônia, você tem sido egoísta, não ligando verdadeiramente para ninguém. Agora compreende, ficou preocupada com os filhos e ama-os com carinho, começa a metamorfose de lagarta a borboleta.
— Obrigada. Grata estou meu amigo, disposta a fazer tudo para melhorar. Que fui no passado?
— Você vestiu na vida anterior corpo do sexo masculino.
Seus pais foram os mesmos que teve nesta, foram ricos, fizeram-lhe todos os gostos e caprichos. Orgulhoso e libertino abusou de muitas mulheres e as abandonou. Seus pais, cientes do erro que cometeram na sua educação, retornaram pobres e receberam-na por filha, deram-lhe amor e tentaram dar-lhe boa formação.
Por eles, foi de grande proveito à lição da pobreza, sofreram, resgataram só que não conseguiram fazer tudo o que pretendiam com você, conduzi-la ao bom caminho. Você acabou ligando-se a Paulo, depois a Jerônimo que a abandonaram como você fez a outras no passado. Nem afetos maternais despertaram em você amor na época, acabou a dor, sábia orientadora, ensinando-a a lição, despertando-a para os valores reais da vida.
— Hoje, amo tanto meus pais, meus filhos e os amigos que servem de pais aos rebentos que abandonei.
— Quando aprendemos a amar, tornamo-nos melhores, mais compreensivos e menos egoístas e, se purificarmos e ampliarmos este Amor, nossa família será toda a Humanidade
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