sexta-feira

O Voo da Gaivota III


Ouvindo uma História

As dissertações ficaram muito boas. Após a leitura de algumas, pelos próprios alunos, concluímos que nem todos têm a mesma impressão do Plano Espiritual. Albertina até me indagou:

- Patrícia, como pode haver tantos modos de ver, sentir e ter sensações diferentes, diante de um mesmo objeto ou lugar?

- Realmente - respondi. - Podem existir muitas formas de sentir os acontecimentos pelos quais somos envolvidos. Estou lembrando agora de algo que ilustra bem este fato. Há algum tempo, ouvi uma estorinha interessante.

"Uma florzinha branca e mimosa floresceu à beira da estrada. Por esse caminho, passavam muitas pessoas e muitas nem sequer a viam. 

Uma mulher, ao defrontar-se com ela, disse: Veja, uma flor à beira da estrada! Ela é medicinal, muito boa para dores. É bom saber que aqui existe, quando precisar, virei buscar. Um poeta que cantava as alegrias e tristezas, as belezas do mundo, também passou pela estrada, e ao ver a flor parou e exclamou comovido: 

Que linda flor! É digna de enfeitar os mais lindos cabelos de uma mulher apaixonada! Mas, infelizmente, no momento não estou amando, senão a levaria para enfeitar minha querida!

Em seguida passou pela estrada uma jovem que, ao ver a delicada flor, parou para admirála. Que florzinha mais encantadora! Que perfeição em seus contornos! Como é bonito ver uma flor a enfeitar uma estrada, suavizando a visão talvez tão cansada e preocupada dos que passam por ela. Com um gesto meigo, beijou a flor e seguiu seu caminho.

Passou por ali também um materialista que, ao ver a flor, falou revoltado e furioso: Flor imbecil, por que veio florir nesta estrada poeirenta? Seu branco não combina com a sujeira do lugar. É uma inútil! Chutou-a e foi embora. 

Um senhor, de quem o tempo havia branqueado os cabelos, ao ver a flor ali solitária, à beira da estrada, exclamou: Como a obra de Deus é perfeita! Como o Senhor do Universo é bondoso conosco, dando-nos belezas assim para nos alegrar! Seja bendita, florzinha branca! Obrigado por você existir e nos alegrar! 

Sabiamente continuou seu caminho. E a singela flor continuou sendo a mesma para todos. Só que, conforme a compreensão, o interesse, o estado de espírito, viam-na de maneiras diversas.

Todos esses personagens, ao verem a flor, reagiram de com seu condicionamento.

A mulher, preocupada com enfermidades físicas, viu na flor seus dotes curativos.

Para o poeta, a flor foi a causa ou o motivo para aflorar em sua mente os devaneios. 

O senil, já desiludido com as ilusões mundanas, ansioso por unir-se a Deus, viu ali a manifestação Daquele que tanto procurava.

Se falarmos a respeito disso com um mestre Espiritual, ele nos dirá que o belo ou o feio que possamos sentir e ver é conseqüência de nossa escolha pessoal. A vida não fez discriminações nas suas manifestações. O bem e o mal estão restritos ao âmbito hominal, assim como o belo e o feio. Cosmicamente, eles não existem, pois nada há em que nâo haja a Onipresença Divina.

Cada ser ou criatura tem sua razão de ser na cadeia das relações em que a vida se manifesta.

Toda manifestação tem os dotes que necessita, para desempenhar sua função. É muito importante que possamos aprender a ver as coisas como são e não como queremos que sejam.As Colônias, Albertina, são lugares que abrigam muitos temporariamente, como no Plano Físico.

E, dependendo de muitos fatores, cada qual as vê como consegue ou quer. Este fato também acontece com os encarnados. Muitos se deslumbram diante de um jardim florido, da visão de um rio, de montanhas, enquanto que alguns nem os vêem e para outros tudo isto é indiferente. 

Considero as Colônias encantadoras.Quando estava encarnada, maravilhava-me com os lugares belos da Terra. Achava lindo o mar,gostava de olhar o céu, as flores, deslumbrava-me e deslumbro-me ainda com tantas belezas.

Nossa Terra é bela!

Descreverei, para melhor ilustrar este fato, uma redação escrita sobre o assunto. Quase todos a fizeram. Vou comentar o que achei mais interessante.

Que coisa fantástica é a vida, e por mais que a observemos, parece-nos sempre nova. Quando ouvimos a história da vida de alguém, sentimos a nossa própria, pois ela nos traz notícias de um ser humano, portanto, a história da própria humanidade. Mas, normalmente, não ouvimos muito as pessoas, pois quase sempre vivemos fechados em nosso mundo interior de tal forma que, mesmo dando-lhes aparentemente atenção, não chegamos a entendê-las. 

Para compreender uma história, é necessário viver as emoções de quem narra os acontecimentos, seu estado psíquico, de alegria, esperança, angústia, rancor, mágoa, gratidão ou qualquer outra expressão emocional.

Escutando com atenção a história de Genoveva, uma pessoa comum, como a maioria dos encarnados ou desencarnados,teremos a oportunidade de entender o porquê de muitas vezes fazermos de nossas existências uma verdadeira tragédia, da qual desfrutamos pequenos momentos de alegria e um tempo sem conta de desespero, frustrações, angústias e dores. 

A personagem possui a manifestação Divina. Amando a presença de Deus, que é o autor de todas as manifestações em cada criatura, teremos compaixão por todos os seres humanos que no momento representam, como atores, no palco da vida. Imbuídos desses sentimentos, podemos ver a enormidade de nossa ignorância.

Como ela começou não importa, o que interessa é tirá-la de nós. Isto está em nossas mãos realizar. Portanto, não convém aplaudir ou censurar os erros ou os acertos de uma pessoa, mas compreender o que a humanidade tem feito com o privilégio de viver, ciente daquilo que somos: seres humanos.

Genoveva começa contando sua desencarnação. Comento-a, porque chegamos à conclusão que está muito relacionada à nossa maneira de viver encarnados, à nossa desencarnação e à nossa vivência aqui, no Plano Espiritual. A própria Genoveva leu sua redação para toda a classe.

"Desencarnei jovem" - começou Genoveva -, isto é não tão jovem. Tinha trinta e sete anos.Amava a vida, possuía lá meus problemas como todo mundo, mas estava satisfeita. Casada, com dois filhos adolescentes, vivia feliz no meu lar. Um dia, como fazia sempre, saí para comprar roupas. 

Estava indecisa entre duas saias e, distraída, atravessei a rua, quando um carro, dirigido por um jovem embriagado, me atropelou. Ele corria além do permitido e eu estava entretida: não deu para evitar o acidente.

Desencarnei no ato. Se as pessoas que viram ficaram abaladas e confusas, imaginem eu. Senti-me jogada no chão e escutei meus ossos se quebrarem. Não senti dor, mas fiquei atordoada. Sentei-me, com dificuldade, na calçada. Não conseguia ver direito e, então, perdi os sentidos. 

Acordei num lugar escuro, úmido, com cheiro nada agradável. Esfreguei os olhos. Tive a certeza de estar acordada. Mas onde? Vi então uma senhora a uns dois metros de mim, que me observava calada. Era bem feia, estava suja, cabelos brancos espetados, achei-a horrível. Ela ficou quieta, enquanto eu a olhava detalhadamente. Concluí, como sempre fazia, que nem todos eram bonitos como eu". Resolvi indagar-lhe.

“A senhora sabe por que estou aqui neste lugar estranho?"

"Não é estranho" - respondeu ela, séria ,- é um lugar como outro qualquer."

"Mas como vim parar aqui? Não me lembro..." – perguntei com delicadeza, tentando ser gentil com aquela estranha mulher.

"Uma tuma das que andam por aqui, a trouxe" – disse ela, após um instante em silêncio.

Escutei eles dizerem que a encontraram sem sentidos, após o acidente. Como não havia ninguém ao seu lado, pegaram-na e a deixaram aí."


"O acidente!"-exclamei." Lembro-me bem!O carro daquele maluco!Mas não era para eu estar num hospital?"

"Se não tivesse morrido, acho que sim, - respondeu a senhora com sua voz rouca, o que para mim, naquele momento ra muito desagradável.

"O que a senhora está me dizendo? Se não tivesse morrido? Por quê? Morri?"

"Que acha? Claro que morreu!" - respondeu dando um sorriso cínico.

"Não e não! Não morri!" - gritei.

"Morreu! Morreu e morreu! - gritou ela mais do que eu. "O carro passou em cima de você e seu corpo morreu. Mas, como ninguém morre de fato, aqui estamos vivas em espírito."

"Faz tempo que estou aqui?" - perguntei assustada.

"Um bom tempo. Estava aí deitada sem sentidos.

"Mas que lugar é este?" - indaguei desesperada.

"Pelo que vê, não é muito bom" - respondeu a senhora após uns minutos calada. "Você não deve ter sido boa coisa, senão teria sido levada para outro lugar."

"Como se atreve?" - falei sentida.

"Ora, ora, falo como quero. Você é morta! Morta!"

"Não e não!"

Repetia já duvidando. Chorei muito, revoltei-me, dei murros no chão até que cansei.

A mulher saiu de perto de mim.


continua...

bjs,soninha


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