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MISTÉRIOS DO PROCESSO DE COMUNICAÇÃO
PARECE ÓBVIO ADMITIR que os nascituros ainda não tenham condições de entender a língua que está sendo falada em torno deles. E nem precisam entendê-la, porque captam, como vimos reiterando, pensamentos que não chegam a ser convertidos em palavras ou, mesmo convertidos, não correspondam à verdade íntima da pessoa que os expressou.
Certa vez, em pequeno estudo acerca dos animais, escrevi que, no meu entender, existe na natureza um nível primevo de comunicação, anterior ao da palavra, independente dela, uma espécie de canal através do qual todos os seres vivos — das plantas aos seres humanos, passando pelos animais ditos irracionais — podem entender-se. A comunicação, portanto, não dependeria das palavras e, sim, dos sentimentos que estão (ou não) por trás da mera expressão vocabular.
Do contrário não teríamos tantas evidências concretas e bem documentadas de comunicação entre seres humanos e animais, ou plantas,bem como entre os próprios animais e plantas entre si.
São hoje de conhecimento geral as reações das plantas ao afeto, aos bons modos, à conversa macia, às emoções das pessoas que as amam e respeitam.
Isso ocorre também com os animais e, claro, com as pessoas. Não é necessário que alguém nos fale para que possamos sentir sua hostilidade ou as vibrações de simpatia e afeto com as quais nos envolva. As vezes percebemos o sentimento de agressividade até atrás de sorrisos bem fingidos e palavras ditas com artificiosa convicção, mas falsas.
É portanto nesse nível atávico, pelo canal por onde circulam as emoções — que podem ou não chegar ao ponto em que se expressam – que nos entendemos uns com os outros, todos os seres vivos, ainda que com as limitações próprias a cada um. A plantinha, por exemplo, não pode responder-nos senão tornando-se mais vigorosa, produzindo melhores frutos ou flores mais belas.
O cãozinho já consegue latir de alegria, balançar o rabinho, virar-se de barriga para cima ou, ao inverso, correr amuado para um canto, quando injustamente escorraçado.
Quando escrevi um livro acerca da mediunidade, um amigo espiritual me informou que somos dotados de um sistema psíquico de circulação, ao qual ele chamou de canal condutor, e de um outro sistema, de exteriorização, ao qual deu o nome de canal expressor. Pelo primeiro, circula o pensamento puro, inarticulado, ainda não codificado em palavras; apenas para uso interno. A tradução desse pensamento em palavras só ocorre no sistema expressor para que, daí, se transmita, ou melhor, se comunique. (Comunicar é tornar comum.)
Conclusão semelhante encontro no eminente cientista Lyall Watson, que em Supernature escreve o seguinte:
Em termos fisiológicos, a distância que nos separa de outros animais não é muito ampla, e a despeito do fato de que dispomos agora de uma elaborada linguagem vocal e outros sofisticados sistemas de comunicação, nossos corpos continuam a mostrar sinais externos de nossos sentimentos íntimos.
Eu não diria, contudo, que os sinais desse entendimento aparecem como expressão corporal, segundo propõe Watson, e sim por um mecanismo mais sutil, que os pacientes da dra. Wambach chamam freqüentemente de telepático.
Esta palavra, a despeito de suas conotações usuais, presta-se bem ao caso. Pathos é um termo grego que significa, primariamente, moléstia, doença, mal; mas, também, paixão, inimizade, afeição. Ou seja, é um termo para descrever certos tipos de sensações (estar doente), ou emoções (paixão, afeto, aversão). Por conseguinte, telepatia vem a ser um mecanismo de transmissão, à distância, de emoções que, obviamente, não precisam ser traduzidas em palavras, como acertadamente imagina Watson.
Aliás esse mesmo Watson, de quem sou leitor assíduo e admirador, registra, em outro livro de sua autoria, The Romeo error, posterior a Supernature, observações mais explícitas acerca do processo de comunicação entre os seres vivos. Comenta ele experiências de Clive Bakster, que acredita na existência de uma “consciência primária em todas as coisas vivas”, a qual Watson, por seu turno, caracteriza, com notável elegância, como “linguagem universal da vida”.
Retomando experiências de Bakster, Watson chegou a incríveis resultados. Vejamos, por exemplo, a que ele fez com uma jovem de nome Tanya.
Submetida à hipnose, Tanya foi convidada a escolher, sem revelar a ninguém, um número de 1 a 10. Em seguida outro experimentador começou a perguntar-lhe sucessivamente: “É o número 1?” “Não”, dizia ela. “É o 2?” “Não.”
E assim por diante, ela negou todos, de 1 a 10. Uma planta, contudo, incluída na experiência e ligada ao detector de mentiras, “entregou” Tanya, revelando que o número por ela escolhido fora o 5. Como é que a plantinha descobriu isso, a não ser por um mecanismo de comunicação direta, usando a “linguagem universal da vida”?
Outra experiência original de Bakster, repetida e aperfeiçoada por Watson, oferece conclusões ainda mais intrigantes. Bakster pegou 18 ovos e os colocou numa espécie de mesinha giratória. De vez em quando, por meio de um dispositivo inteiramente aleatório, um dos ovos soltava-se e descia, por uma canaleta, até uma vasilha de água fervente. Bakster notou que o ovo ligado ao detector acusava imediata reação no momento em que o “companheiro” mergulhava na água fervente, mas nenhuma reação registrava quanto à queda dos demais 17 ovos, a não ser que houvesse decorrido um espaço mínimo de tempo de 15 minutos. Qual a explicação?
Ao repetir a experiência, Watson notou que o bloqueio não ocorria no ovo receptor, ou seja, aquele que estava ligado ao detector, e sim nos 17 que permaneciam na mesinha giratória e que interrompiam prontamente a comunicação logo que o “companheiro” mergulhava na água fervente.
A única explicação possível que ocorre à mente (escreve Watson) é a de que, quando o primeiro ovo cai na água fervente e emite seu sinal de alarme, os outros 17 ovos, à espera de sua vez, ‘desmaiam’ todos — e que são necessários 15 minutos para que eles se recuperem.
A propósito disso Watson lembra a tradição dos Sioux, como também outros índios norte-americanos, que adotam certos rituais que somente agora começam a fazer sentido. Quando se torna necessário preparar um novo “totem” para a tribo, os mais velhos se reúnem e vão à floresta, a fim de conseguir uma boa árvore que forneça a madeira apropriada, com a qual possam elaborar a figura. Encontrada a árvore, aproximam-se todos, cerimoniosamente, em semicírculo, e “conversam” com ela, mais ou menos nos seguintes termos:
Olhe aqui, árvore, lamentamos muito, mas você sabe como é importante para nós o nosso ‘totem’, e o antigo está todo estragado.
Precisamos de um novo tronco... e, então, escolhemos você!
Dito isto, sem olhar para trás, todos se retiram apressadamente, aproximam-se da primeira árvore que encontram mais ou menos semelhante àquela e a cortam para fazer dela o desejado “totem”.
Ao que saiba Watson, ninguém jamais perguntou aos Sioux a razão desse estranho procedimento. Não há dúvida, porém, de que os índios sabem das coisas. Relacionando isto com o comportamento dos ovos da experiência de Bakster, Watson declara-se inclinado a concluir que, talvez, todas as árvores da floresta desmaiem quando a primeira delas ouve sua sentença de morte.
Ao que parece, portanto, os índios cortam uma árvore desmaiada e, portanto, anestesiada, para não lhe causarem dores desnecessárias, mesmo tendo em vista o nobre fim a que se destina a madeira que ela lhes proporciona.
Claro que o leitor tem direito às suas próprias idéias e explicações.
Quanto a mim, fico com Watson, que por sua vez está com os índios, que estão com os segredos da natureza!
Mas voltemos, por um momento ainda, à dra. Wambach.
Acho que essa forma de entendimento sem palavras, ou quando as palavras podem até comparecer, mas são desnecessárias, é um tipo de comunicação que fica apenas pelos canais condutores do qual meu amigo espiritual falou, sem se converterem em qualquer tipo de código ou símbolo, no sistema expressor. Mesmo que seja apenas, como dissemos há pouco, para uso interno, os demais seres vivos da natureza têm condições de captar o que se passa na intimidade alheia.
Observo, pois, com alegria, que um paciente da dra. Wambach descreve, com rara felicidade e precisão, o curioso mecanismo, ao dizer o seguinte:
Após o nascimento (escreveu ele em sua ficha) sinto a presença de diferentes e esparsas energias e intensidades à minha volta. Com uma percepção muito clara, eu tinha consciência dos sentimentos das demais pessoas. As coisas eram perfeitamente óbvias, mas não específicas ou explicáveis em sentido intelectual. (Grifo meu.)
Tudo o que foi dito, e mais o que permanece apenas no óbvio “nãointelectual” sugerido pelo paciente da doutora, se resume numa conclusão irrecusável: podemos nos comunicar com os bebês — desde que nascem ou até mesmo antes. Eles não terão condições para responder-nos da maneira que entendemos o diálogo entre seres humanos, mas suas mentes e seus corações estão abertos ao acesso de sentimentos, emoções, conflitos,alegrias, afeto ou aversão, e a sutilezas que sequer podemos imaginar.
Eu dizia que podemos nos comunicar com nossos bebês, mas deixe-me corrigir logo: devemos nos comunicar com eles. Isto é de importância vital, que eu não saberia como enfatizar suficientemente.
Disponho de casos concretos sobre o assunto, experiências pessoais e relatos de pessoas muito chegadas, que me transmitiram em primeira mão, a meu pedido, suas próprias observações.
Um desses casos narrei sumariamente em meu livro Diálogo com as sombras. Havíamos trabalhado durante meses com um espírito bem difícil, porque ainda estava extremamente magoada — era uma mulher — com um dos componentes do nosso grupo. Viveram, no século passado, uma paixão algo tumultuada, que deixou sequela que transbordou e, naturalmente, sobreviveu com eles. Ao cabo de longo e carinhoso diálogo, que se desdobrou por alguns meses, conseguimos pacificar o espírito, que começou a preparar-se para renascer; aliás, na família de quem, no passado, fora seu companheiro.
Seria, desta vez, filha de uma jovem que naquele tempo tinha sido filha do casal. Isto a colocava, nesta vida, como neta do seu antigo amor.
A criança estava com poucos meses quando tive oportunidade de visitá-los. A jovem mãe me convidou para vê-la, em seu berço, onde ela dormia profundamente. Temeroso de que ela despertasse, pedi à moça que não acendesse a luz, mas ela insistiu, dizendo que a criança não acordaria, pois estava acostumada. De fato a menina continuou adormecida por alguns momentos, enquanto eu a contemplava, emocionado e em silêncio.
De repente ela abriu os olhinhos, fitou-me com uma expressão enigmática, sorriu e voltou aadormecer. Foi fácil entender seu mudo “recado”:
“Ah, é você? Já estou aqui, amigo.”
Deixe-me contar outro caso.
Encontrava-me, certa vez, em casa de uma família que acabara de tomar uma menina de meses para criar, quando fiquei sozinho com a criança por alguns momentos. Aproximei-me do bercinho — ela estava desperta — e comecei a falar-lhe mansamente, dizendo-lhe que agora ela estava bem.
Haviam passado as aflições e dificuldades maiores. Tinha, agora, uma casa e pessoas amorosas para cuidarem dela. Que ficasse em paz e tranquila. E que Deus a abençoasse.
Mesmo acostumado a tais coisas, levei verdadeiro susto ante sua reação inesperada. Ela me olhou profundamente, com lágrimas a lhe escorrerem pelo rosto! Era visível o esforço que fazia para dar expressão às emoções que se agitavam em seu ser. Estava tão desejosa de dizer-me alguma coisa que seu rostinho era uma só ansiedade. Mas ali não havia o menor traço de dor. Só pude entender a linguagem silenciosa das suas lágrimas, mais nada... a não ser somar minhas emoções às dela...
Nosso entendimento ficou no nível atávico, sem necessidade de emergir.Outros casos, por sua natureza específica, vão para o capítulo seguinte.
Paz a todos...
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