terça-feira

Morri ! e Agora ? // 07


Capítulo sete
O Presidiário

Nem todas as ações que consideramos prazerosas têm reações agradáveis!

Estava triste pensando nisso. Meu corpo físico havia morrido há dias. Sofri muitas dores, tive câncer nos rins. 

A falta de um diagnóstico mais detalhado e de um tratamento abreviou minha estada encarnado.

Estive preso em um grande presídio e continuei ali. Bastava subir uma escada,que antes não via nem sabia que existia, para estar numa outra enfermaria. Ainda me sentia adoentado, sem, porém, sentir as dores terríveis.

Acabrunhado, tentava disfarçar meu temor e me indagava: o que será de mim agora?

Havia morrido e continuava vivo. Confuso, sem entender bem o que me aconteceu, vi por ali companheiros que também haviam falecido, e deles escutei:

- Marcelão, a vida é assim mesmo, ora lá e ora cá!

- O corpo de carne morre e nossa alma vem para esse lado!

-Alguns saem daqui e outros não! Não se aborreça e procure não se entristecer!

Apesar de ouvi-los, continuei triste porque ninguém sentira meu falecimento, nem fora ao meu enterro, e não recebera nenhuma oração.

- Venha, Marcelo, vamos para cima descansar!

Esse desencarnado que me falou, era diferente, estava limpo e era agradável de se ver.

- Converse comigo - pedi -, explique-me o que me aconteceu.

- Marcelo, seus companheiros têm razão, seu corpo físico morreu, e quando isso acontece continuamos vivos, vivendo com esse corpo ao qual chamamos de perispírito. Muitos, quando isso acontece, saem do presídio e outros continuam, ficam aqui para aprender.

- Você é diferente! Esteve preso? - perguntei.

- Não! Não estive, quando encarnado, em presídio, estou aqui trabalhando,ajudando e aprendendo.

Fiquei alguns dias nessa enfermaria. Sentindo-me melhor, desci, e lá estavam meus companheiros que ficaram no corpo carnal.

Percebi a diferença. Vi que a construção da enfermaria em que estava era espiritual e os encarnados não a viam.

Estranhei muitas coisas. Muitos desencarnados estavam ali, alguns pareciam enlouquecidos, outros com ódio profundo dos encarnados que ali estavam, a eles ficavam unidos,permanecendo presos também. Outros, como eu, mudaram de plano e não sabiam o que fazer, E também haviam desencarnados que eu sentia serem bons, que chamávamos de Anjos do Senhor ou de socorristas, estes auxiliavam a todos. Trabalho duro o
deles!

Aproximei-me de um socorrista, que tentava cuidar de um encarnado que havia sido surrado. Ele me explicou:

- Como vê, nosso trabalho é difícil! Ele não está receptivo, isto é, vibrando bem para receber nossa ajuda. 

Está com raiva.

Não tenho muito o que fazer. Outros encarnados poderiam ajudá-lo.

- Você fica aqui o tempo todo? Ou pode sair? - quis saber.

- Não estou preso, trabalho aqui e posso sair. Todos os desencarnados que você vê neste posto têm liberdade de ir e vir.

Vê aquele grupo? São desencarnados que vieram verificar se seus desafetos estão sofrendo. Outros aqui vêm para visitar, dar esperança aos entes amados.

Uma senhora desencarnada aproximou-se do moço surrado e o abraçou.

- É a mãe dele que está no plano espiritual; ela veio acalentar o filho explicou o socorrista.

O trabalhador afastou-se e eu fiquei olhando aquela mãezinha, em lágrimas, beijar e abraçar o filho. Ele nem percebia.

Não conheci minha mãe, fui criado pelo meu pai e minha madrasta. Era muito impulsivo, a mulher de meu pai, aconselhava-me:

"Marcelo, não seja assim! Você fica nervoso por qualquer coisa e agride. Um dia irá se arrepender".Não parava em empregos, estava sempre brigando Apaixonei-me e casei, tivemos dois filhos. Brigava muito com minha esposa e a surrava, arrependia-me e me desculpava.

Ia a bares e bebia, mas não me embriagava Um dia, no bar, numa briga, um homem sacou de uma faca e me feriu na perna, revidei, conseguindo desarmá-lo; matei-o. Arrependi-me, mas fiquei preso por oito anos. 

Nesse tempo recebi poucas visitas, soube que minha mulher arrumou outro marido e que meus filhos sentiam vergonha de mim. Desencarnei sozinho e abandonado. Não dei valor à família e fiquei sem ela.

Passei a ficar perto dos socorristas vendo o que eles faziam.

- Marcelo, passe esse pacote! Venha me ajudar! Comecei a fazer pequenas tarefas e me senti melhor.

- É ajudando que nos sentimos bem - explicou um deles. - Por que você não trabalha conosco? Sabemos que se arrependeu por ter assassinado uma pessoa. Pagou por isso e na prisão ajudava seus companheiros.
Era"Verdade. Sofri muito quando fui para o presídio. Foi um horror Briguei, bati, apanhei muito e aprendi a me controlar.

Trabalhei na cozinha, na enfermaria e estava sempre consolando os que sofriam. E como se sofria ali.

- Por que tenho de ajudar assassinos? Por que vocês os auxiliam? - indaguei.

Marcelo, você se lembra da parábola do samantano3? O que ajudou o ferido na estrada?

3 • KARDEC, Allan O Evangelho Segundo o Espiritismo Capítulo 15 São Paulo Petit Editora (N E)

- Sim, lembro-me! - respondi.

- Depois de alguns meses no presídio, passei a ler e a estudar a Bíblia com um grupo, e foi isso que melhorou meu caráter.

- Pois então - explicou o socorrista -, o "próximo", além do ferido são os bandidos que o feriram. A Humanidade toda é nosso próximo. Não se consegue amar o Pai Divino se não amarmos nossos irmãos humanos.

- Quero trabalhar! Posso aprender com vocês a ajudar! Mas para começar vou auxiliar quem sei ser inocente. João da Pinha está aqui sem ser culpado.

O socorrista sorriu concordando. Fui até a cela do João da Pinha.

Por causa de uma armação, ele, um inocente estava preso. Ali todos o tratavam bem. Eu, quando encarnado, facilitava sua vida, dava-lhe até mistura da minha comida.

Estive preso, mas era culpado, ele não.

Aproximei-me do João da Pinha e estranhei, ele tinha a mancha rubra que tem os homicidas. Fiquei observando-o. Examinei Jair, o companheiro de cela do João, que fora um ladrão hábil, ele não tinha o sinal de assassino. Cheguei perto do João da Pinha e escutei seus pensamentos: 

"Matei os dois e não me arrependo, devo continuar mentindo, vou acabar conseguindo sair daqui".

Fiquei muito surpreso. Acreditávamos que ele era inocente. Tanto que um dia reunimo-nos e pedimos para falar com o diretor sobre a injustiça que estava sendo feita ao João, pois ele era inocente.

Ele não era! Decepcionado corri até o socorrista.

- Ele não é inocente!" Matou mesmo sua mulher e seu sócio.

- Ele também necessita de auxílio! - exclamou o socorrista. - Uma ajuda diferente. Tente fazê-lo pensar que erra em continuar mentindo e em querer que um inocente seja preso. Marcelo, aqui há presos que não cometeram os crimes dos quais foram acusados, mas não há inocentes.

Não me aproximei mais dele, estava decepcionado. João da Pinha, meses depois, saiu do presídio. Eu fiquei ajudando os socorristas.

- Esse é inocente! - exclamei. - Bandidos armaram para ele!

- Na outra existência ele cometeu um crime e não foi preso.

- Porisso que vocês dizem que aqui não há inocentes! Ainda bem que paguei pelo meu crime.

Um socorrista me levou para ver meus filhos. Chorei de emoção, eles estavam estudando, eram boas pessoas, tratavam o padrasto como pai e esse gostava deles. Agradeci o homem que ficou em meu lugar. Senti-me bem com esse gesto.

Quando voltei, o socorrista responsável pelo trabalho no presídio, um senhor que orientava a todos, foi conversar comigo.

- Marcelo, agiu bem, sua atitude diante de sua família foi correta. Também estamos satisfeitos com seu trabalho. Você está apto a conhecer outros lugares e a estudar.

Quer ir para uma colónia espiritual? Já ouvira os socorristas comentarem sobre as cidades da espiritualidade. 

Pensei na proposta e achei que não saberia me comportar, dei minha resposta:

- Acho que ainda tenho muito que aprender para ir morar em uma colônia. Quero ficar mais tempo aqui!

- Então fique como socorrista!

Alegrei-me, senti-me orgulhoso e passei a ser um socorrista. Ajudava meus excompanheiros e os que desencarnavam ali.

Dez anos se passaram. Vi, no presídio, muitas coisas. Prisões são lugares de resgate, deveriam ser escolas que educam. Muitos presos melhoram através de lições dolorosas.

Outros, pioram, revoltam-se, desesperam-se, odeiam e aprendem lições que os tornam piores e capazes de cometer crimes piores.

Todos são carentes de conselhos bons, ajuda e orientação.

Senti necessidade de estudar e fui para uma colônia. Adquiri muitos conhecimentos nesses anos em que estive trabalhando com os socorristas no presídio. Mas havia muita coisa para ver e conhecer.

Aprendi pela dor a me conter, a não ser impulsivo, a não deixar a raiva me dominar. Poderia ter aprendido pelo amor, pelos conselhos. Atualmente sou calmo, modifiquei-me, e isso ocorreu quando comecei a me preocupar com o próximo e passei a ser mais caridoso.

Tenho muitos planos: quero trabalhar aqui na espiritualidade em vários lugares e conhecer as muitas formas de auxiliar com conhecimento. Só depois pedirei para reencarnar.

Quando não se tem a consciência tranqüila, a morte do corpo físico nos dá muito medo e insegurança. Temerosos indagamos:

"E agora?". Mas a vida continua e sempre encontramos quem nos auxilia. Somente nos sentimos bem, quando passamos a ser úteis.

Encontrei com a pessoa a qual assassinei. Tornamo-nos amigos. Compreendemos que nós dois erramos. Ele me falou que ao desencarnar sofreu muito e teve raiva de mim.

Depois compreendeu que ele também errara, então perdoou, pediu ajuda e foi socorrido. com o perdão a mancha rubra sumiu de mim.

Bendito o perdão!

Marcelo

Explicações de Antonio Carlos

Aqueles que têm percepção de ver enxergam tanto encarnados como desencarnados envolvidos por cores. Refletimos na aura o que somos de verdade e as cores indicam o que pensamos, o que fazemos etc. Pessoas boas refletem cores claras e brilhantes, parecendo luzes. Por isso que santos são vistos, foram e são pintados envoltos por luzes ou auréolas nas cabeças. Os viciosos e os que se entregam aos sentimentos fortes irradiam cores escuras e acentuadas.

Dizem que os assassinos têm sangue nas mãos. Não nas mãos do físico, pois essas são lavadas e ficam limpas, mas nas mãos perispirituais, e para limpá-las, são necessárias lágrimas de dor ou um trabalho edificante. Assassinos são vistos também envoltos de um vermelho forte principalmente nas mãos, como já disse, e na cabeça. Para Marcelo, essa era a marca dos homicidas. Não deixa de ser, porque no plano espiritual não tem como mentir, enganar, não há como disfarçar o que somos.

Marcelo também tinha a sua aura rubra, até que se reconciliou, sentindo-se perdoado, não só pelo outro, mas por si mesmo. E essa cor forte desapareceu nesse convidado quando ele passou a fazer o bem. com seu trabalho de ajuda diário, a marca foi clareando e a cor rubra foi enfraquecendo até que sumiu, dando lugar a outra mais clara, a do aprendizado, da caridade e da compreensão.

Em todas as prisões há equipes de socorristas e em quase todas existe um posto de socorro onde trabalhadores do bem têm um lugar para ficar e enfermarias que auxiliam os que lá desencarnam. Dos que tiveram o corpo físico morto em prisões, alguns vão para o umbral por serem afins de outros, ou para continuarem presos pelos desafetos.

Outros, são socorridos e levados para colônias, e há os que saem e vão para os antigos lares ou ficam a vagar. A minoria, como Marcelo, é orientada ali mesmo pela equipe de trabalhadores. com o tempo, essa pequena parcela de ex-presos passa a aprender a realizar tarefas, ficando sob a orientação de socorristas mais experientes. Isso para compreender que é ajudando que se recebe ajuda. Quando passam
a gostar do trabalho lhes é oferecido estudo e conhecimento do plano espiritual. Preso cumpre pena, paga pelo crime sendo privado de sua liberdade. Muitos dos que foram presos pagam realmente, isto é, resgatam
pela dor os erros que cometeram. 

Mas somente se livram das cores fortes dos vícios os que se arrependeram, pediram perdão e perdoaram sinceramente. Todos nós, onde quer que estejamos, podemos ajudar o próximo. Mas há tarefas que
requerem muito boa vontade, amor e dedicação, como o trabalho dos socorristas que servem no umbral, local onde há guerras, torturas e nas prisões. Tenho muita admiração por esses abnegados trabalhadores, desconhecidos dos homens, mas conhecidos de Deus.



Paz a todos...

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